ADEUS LISBOA
Portugal | 2012 | Digital | Cor | 20’
Realizador: João Rodrigues

Sinopse: Um pai e um filho reencontram-se em Lisboa. O pai está doente.

 

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ADEUS LISBOA

Antes deste Adeus Lisboa, que nasce de experiências muito pessoais, João Rodrigues fez A Nossa Casa, treze minutos de incessantes procuras pelos séculos e pelas ramagens e paisagens da Ilha do Faial, através das memórias e de registos dos Dabney, de imagens antigas e plenas de mistério e da voz de Astrid Menzel, que aparece no fim deitada sobre a terra de que se tem que despedir, tal como José Lopes no fim de Adeus Lisboa. Ouvimos a água do rio que corre perto desse local e se dilui com os primeiros acordes ao piano de Deep River, canção do Paul Robeson de também profundíssima voz. Canta sobre travessias, terras prometidas e sente-se o peso da distância, sente-se a saudade nos graves do seu cantar. Ouvem-se as elegias dos homens à natureza, com a certeza que é sempre ela que canta as nossas.

Desse fundo negro para o seguinte, ao som de Olhos Negros, canção tradicional dos Açores, agora na voz de José Lopes, peregrino que de bagagem leva a guitarra e uma canção e aqui interpreta o pai doente de João Rodrigues. A sua voz é já fonte de luz impossível nesse fundo negro, já o sentimos a desafiar a morte. Deixando-se perder nos passeios e nas histórias dos desencontros de que se tenta lembrar quando está com o filho no parque, corta uma laranja e divide-a com ele como se tivesse todo o tempo do mundo. E talvez seja esse tempo o que mais interesse a João Rodrigues neste filme feito dessas dádivas, grandes e pequenas, que fazem a estadia passageira que temos neste mundo valer alguma coisa.

Lembro-me agora de The Sunchaser de Michael Cimino, em que o Blue, o miúdo moribundo do filme, desata a correr em direcção a um lago, desaparece e se dilui com a água e com os ventos. Depois de viver uma viagem de aproximações cautelosas mas que acabam numa bela amizade com o Dr. Reynolds, interpretado por Woody Harrelson. Talvez sejam essas coisas que redimam o homem e o tornem merecedor da Terra que pisa.

E volto a ver o José Lopes sentado nessa colina, a apontar para a antiga casa e para as árvores em redor, conversando com elas como se gente fossem. E volto a pensar na canção de José Afonso e a vê-lo “da morte zombando na aurora lunar, num jardim suspenso do seu folgar.”

João Palhares